Coisa de Mulherzinha.

Ao pecado do mundo foi dado a uma mulher a responsabilidade. Aos males do mundo, Pandora foi culpada. Bruxas foram queimadas. Mulheres adúlteras foram apedrejadas. Não eram consideradas cidadãs, não tinham direitos civis e não podiam votar.
Em mais de 30 países, mais de 200 milhões de mulheres já tiveram seu clitóris mutilado. Incapazes, sentimentais e sensíveis demais. No metrô, passam-lhe a mão e, por vezes, o órgão sexual. Na rua, assoviam. Na sala de parto, passam o fórceps, o bisturi, a mão, apressam, mandam calar a boca, as violentam.
Na rua ou em qualquer lugar, estupram-lhe. Abortar? Não é possível, é um crime. Dar o filho para a adoção? Inacreditável, quem mandou ser estuprada?
No trabalho, ganham menos pois têm filhos e por dar à luz, são sensíveis demais, incapazes.
Historicamente, a violência contra mulher é uma coisa incrustada, intrínseca e pegajosa. Desde que o mundo é mundo, nascer mulher é uma sentença, é viver na espreita, com medo, sendo sempre uma vítima em potencial. Em casa, na escola, na rua, no trabalho e até no hospital.
Me parece que nem o ato de dar à luz traz-lhe à piedade, as dores não doem nos homens - não são legítimas.
Ser mulher cansa. Ter de falar mais alto e mais vezes para tentar convencer as pessoas da nossa inteligência e capacidade é exaustivo.
Portanto, digo, cada vez que uma mulher sofre qualquer tipo de violência, todas as mulheres morrem um pouco. Lutamos a tanto tempo por uma mudança lenta e mínima, que cansamos. Não sabemos, quiçá imaginamos a sensação de andar em segurança e ter o corpo respeitado. Simone de Beavouir, dizia que se torna mulher. Mas que mulher nos tornamos? Ninguém sabe porque somos assim, a sociedade apenas repete uma cultura violenta sem se questionar. Nós não merecemos ser mulher assim.
Todos os dias são de luta. A violência desejo justiça - dos homens e divina. Nós estamos cansadas, mas ainda não desistimos.
Natália Bueno é aluna da turma 6 do curso de medicina da UFMS-CPTL e responsável pela coluna "Socializando a Pauta", publicação de 22 de julho de 2022.