MATÉRIA ESPECIAL: O NOSSO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO (REGIONAL)
Atualizado: 1 de abr. de 2022
Um breve histórico sobre o Hospital Regional de Três Lagoas, as expectativas dos alunos e docentes do curso de medicina da UFMS e as incertezas sobre a sua administração

Um breve histórico da construção do Hospital Universitário de Três Lagoas
O curso de medicina da UFMS, Campus de Três Lagoas (CPTL), teve início no ano de 2014 com o ingresso da primeira turma. Em conjunto, autoridades das esferas municipais, estaduais e federais declararam o interesse na participação do desenvolvimento e estruturação do curso.
Nesse contexto, ao longo dos anos e do avanço do curso, novos docentes e técnicos foram incorporados, assim como o curso teve um salto de qualidade com a entrega de um Bloco de salas de aulas e laboratórios próprio, o Bloco VIII, da Unidade II do CPTL.
Durante todo o percurso para o crescimento do curso, em qualidade, principalmente, os alunos precisaram buscar frente à reitoria da UFMS, assim como ao governo de Três Lagoas, o direito aos espaços para as aulas práticas, fundamentais para a formação de qualidade dos alunos, mesmo que, inicialmente, as esferas citadas acima tivessem garantido a participação e manutenção do curso na cidade.
Conquistamos diversos espaços, com a importante contribuição das coordenações do curso de medicina, dos professores engajados na luta para que o nosso curso sempre mantivesse a excelência de ensino e formação, da diretoria do CPTL e da reitoria da UFMS. Atualmente temos como campos para práticas: Hospital Nossa Senhora Auxiliadora (HNSA), que nos recebeu e tem ampliado a nossa participação no corpo clínico, sendo imprescindível para a nossa formação, assim como toda a rede municipal de saúde (CAPS AD, CAPS II, CEM, CDC, UPA, ESFs, EACs, UBS, Clínica da Mulher, Clínica da Criança, Clínica de Ortopedia e outros espaços eventualmente necessários para as práticas) e o Hospital Psiquiátrico de Paranaíba “Dr. Adolfo Bezerra de Menezes”.
No entanto, também faz parte da estruturação do nosso curso a implantação do Hospital Regional de Três Lagoas (HRTL), anteriormente também denominado como Hospital Universitário de Três Lagoas, pelas Assesorias de comunicação dos governos do estado de Mato Grosso do Sul e do município de Três Lagoas. Nesse sentido, o hospital, independente da forma como será denominado, deveria ter sido entregue no ano de 2014, concomitante com o ingresso da primeira turma de medicina da UFMS, com o intuito de já constituir a rede de campos de práticas do curso, com os outros já existentes e citados. Infelizmente, após diversos percalços relacionados às licitações para a construção da obra, apenas no ano de 2017 as obras foram iniciadas, com o objetivo de serem entregues, inicialmente, no ano de 2019, como será abordado mais para a frente nessa matéria.
Houve até mesmo relatos de autoridades na época sobre a implantação do Hospital Universitário, conforme consta: “A vice-governadora estima que, até dezembro de 2014, poderão estar prontas as obras de construção do Hospital Universitário de Três Lagoas, com capacidade para 136 leitos. Segundo consta no projeto arquitetônico da obra, o Hospital Universitário de Três Lagoas será um complexo de três blocos, sendo o primeiro com quatro pavimentos ou andares, o segundo com três pavimentos e o primeiro com um pavimento (térreo).” (Assessoria de comunicação do governo municipal da cidade de Três Lagoas).
Outro relato durante a solenidade de instalação do curso foi o seguinte: “Nos dois primeiros anos do Curso, a Faculdade de Medicina, em funcionamento na Unidade II da UFMS – CPTL, funcionará em instalações provisórias, mas existe o projeto de prédio próprio, de 8 mil m² de construção, e também o da construção de Hospital Universitário Regional.” (Assessoria de comunicação do governo municipal da cidade de Três Lagoas).
O governo estadual também foi responsável por diversos relatos a respeito do hospital, como pode ser exemplificado pelo trecho publicado pela Secretaria de Governo do Estado: “O hospital representa um avanço à saúde de Três Lagoas e de toda a região. Vai atender à demanda do município e da população do Bolsão, que tem a nossa cidade como referência no atendimento à saúde. Vai ampliar a quantidade de leitos, médicos e vai auxiliar na formação dos alunos de medicina da UFMS. É a realização de um sonho e uma grande conquista para a cidade”, destacou o prefeito de Três Lagoas".
Sendo assim, como pode-se observar, brevemente, o projeto para a construção de um hospital direcionado para o ensino na cidade de Três Lagoas, sobretudo para receber o curso de medicina da UFMS, já existe há alguns anos. O desejo dos alunos e docentes do curso é justamente que, após esse considerável tempo de espera e de expectativa, possam ter a garantia de mais esse importante campo de prática, somado aos outros já utilizados atualmente, constituindo então um vasto campo de práticas de qualidade.
E, para completar as informações a respeito do futuro HRTL, explicamos qual o papel de um hospital universitário, a visão de alunos e docentes que estão acompanhando o desenvolver das obras e uma breve explicação dos formatos de administração desse tipo de estabelecimento já presentes e comumente utilizadas em nosso país. Acompanhem abaixo.
O que é um hospital universitário?
Os hospitais universitários (HUs), também conhecidos como hospitais-escola ou hospitais de ensino, são centros de formação de recursos humanos e de desenvolvimento de tecnologia para a área de saúde, além de possuírem um papel ativo nas comunidades onde estão inseridos, aprimorando o atendimento e a elaboração de protocolos técnicos para diversas patologias. Tais hospitais são mantidos por universidades ou atuam de modo colaborativo, visando cooperar nas atividades de formação e de investigação de profissionais da área da saúde, como medicina, enfermagem, fisioterapia e nutrição. Dessa forma, foram criados diante da necessidade de unidades assistenciais nas quais se articulassem ensino, pesquisa e a habilitação de profissionais de saúde.
Até a década de 1950, as instituições filantrópicas serviram como campo de formação de profissionais de saúde. Nos trinta anos seguintes, houve uma proliferação das escolas públicas de medicina e, com isso, o desenvolvimento do ensino em hospitais vinculados àquelas instituições. Nota-se que, apesar de existirem diferentes contextos que levaram à fundação dos HUs, a demanda por um espaço prático para os cursos de Medicina é uma das principais motivações para suas fundações. A criação do Sistema Único de Saúde em 1988, com seu caráter de gestão descentralizada, isto é, que favorece a gestão local, estreitou ainda mais as relações entre HUs e os gestores do sistema, integrando a assistência ao ensino.
Nesse sentido, atualmente, os HUs são centros de referência de média e alta complexidade para o SUS. A rede de hospitais universitários federais é formada por 50 hospitais vinculados a 35 universidades federais. Destes, 43 hospitais são vinculados à rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), empresa estatal. Atualmente, a importância dos hospitais universitários é mundialmente reconhecida principalmente por serem grandes produtores de conhecimento a partir do desenvolvimento de pesquisas.
No Brasil, o ensino e a assistência são aplicados com êxito, uma vez que os HUs atuam complementando a rede primária e básica de saúde realizando procedimentos de média e alta complexidade, que vão desde consultas e exames especializados até procedimentos mais complexos como tratamento cardiovascular, oncológicos e transplantes. É fundamental também para o desenvolvimento de programas de residência médica. Quanto à pesquisa, possui um grande potencial sendo fundamental para as melhorias futuras no âmbito da saúde no país.
Hospital Regional de Três Lagoas e o atraso na conclusão da obra
O Hospital Regional de Três Lagoas (HRTL) será uma unidade estratégica para o atendimento hospitalar na região do Bolsão Sul-Matogrossense, região que compreende dez municípios, sendo eles: Água Clara, Aparecida do Taboado, Brasilândia, Cassilândia, Chapadão do Sul, Inocência, Paranaíba, Santa Rita do Pardo, Selvíria e Três Lagoas. Porém, a conclusão da obra tem sido prejudicada em razão dos atrasos ao longo da construção e do adiamento dos prazos para a finalização.
A data inicial prevista para a conclusão da obra era 30 de março de 2019. Com a primeira prorrogação, o prazo foi estendido, sendo fixada a segunda data para 31 de outubro de 2019. Porém, com atrasos na evolução da obra, a terceira data foi apontada para 31 de março de 2020 e, posteriormente, agendada novamente para 30 de junho de 2020. Dessa forma, outro adiamento marcou a entrega para o dia 30 de outubro de 2020. Entretanto, a data prevista na última prorrogação também não foi cumprida.
“Com sucessivos adiamentos ao longo da construção, foi estabelecida, como última data de entrega, o dia 30 de outubro de 2020. Entretanto, essa data prevista na última prorrogação também não foi cumprida”
A Secretaria Estadual de Saúde (SES) esperava que a obra fosse entregue até o final deste ano, possibilitando a ativação do Hospital, com todos os equipamentos, no primeiro trimestre de 2021. Entretanto, com os adiamentos na conclusão dos últimos retoques, essas estimativas serão alteradas novamente.
Qual a visão dos alunos que visitaram as obras do hospital?
Em novembro deste ano, alguns alunos das turmas 2 e 3 visitaram as obras do HRTL e nos contaram um pouco sobre como foram suas “primeiras impressões” da tão esperada obra. Bruno Oliveira (T3) e Luís Eduardo (T2) relatam que, segundo os empreiteiros responsáveis, 95% da edificação já está pronta, com piso, iluminação, ar condicionado etc., montados na parte interna, enquanto na parte externa o calçamento e pintura ainda estão incompletos. A previsão é que no início de janeiro ela esteja finalizada.
Segundo Bruno Oliveira, o hospital está “completamente preparado para receber os acadêmicos: possui salas de aulas, salas para discussão de casos, anfiteatro, alojamento, cozinha e salas de centro cirúrgico bem amplas”. Além disso, foi relatado que nele, será desenvolvido não somente o âmbito do ensino, mas também da pesquisa e extensão, assim como objetiva-se em todos os hospitais universitários, trazendo novidades em terapias, manejo de patologias e melhorias em saúde de forma geral. O panorama descrito pelos alunos mostra a enorme importância social de um HRTL para toda a região leste do estado, que poderá realizar procedimentos de maior complexidade sem a necessidade de encaminhar para outros centros. Segundo Bruno, tudo isso deixa os alunos com ótimas impressões e boas expectativas para a finalização do tão esperado HRTL, que será também um Hospital Universitário, atendendo então as demandas do curso de medicina da UFMS, do Campus de Três Lagoas.
E qual a visão de alguns professores do curso com relação ao Hospital Regional?
Segundo o professor, médico anestesista e coordenador do curso de medicina da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Câmpus de Três Lagoas, Carlos Eduardo Macedo, para um bom funcionamento de um curso de medicina com qualidade é fundamental a disponibilidade de um hospital que tenha um ambiente favorável ao ensino. Hoje o curso possui uma boa parceria com o Hospital Nossa Senhora Auxiliadora (HNSA) e outras instituições, como o Hospital Psiquiátrico de Paranaíba e toda a rede municipal de saúde da cidade de Três Lagoas. O hospital regional tem uma estrutura que foi pensada para ser um ambiente acadêmico. Com salas de aulas, anfiteatros e um ambiente preparado, portanto, para discussões clínicas, de modo que seu funcionamento virá agregar ainda mais qualidade ao nosso curso, sem, no entanto, prescindir dos outros parceiros. Teríamos mais um espaço para aumentar os nossa atuação e poderíamos sonhar com residências médicas e multiprofissionais.
Para a professora e enfermeira Dra. Priscila Balderrama, o hospital, por definição, é um estabelecimento de saúde que tem como característica básica a prestação de cuidados de saúde a pacientes internados durante as vinte e quatro horas do dia. Aliás, também fornece os meios diagnósticos e terapêuticos com o objetivo de prestar assistência curativa e de reabilitação, atividade de prevenção, assistência ambulatorial, atendimento de urgência e emergência e de ensino e pesquisa. É parte integrante de uma rede de atenção à saúde composta por uma complexa rede de ações e serviços que se comunicam e cooperam entre para integralidade do cuidado. Dentro da lógica das redes de atenção à saúde, aos hospitais, cabe a resolução das condições agudas ou dos momentos de agudização dessas. Nesse sentido e, considerando-se um dos principais gargalos do SUS (que é o acesso), a implementação do HRTL para o atendimento da população da região do Bolsão sul-mato-grossense será um ganho muito grande para toda a comunidade. Além disso, também será de extrema relevância para o desenvolvimento das atividades de ensino e pesquisa, o que alavancará, ainda mais, o potencial da Universidade.
Já o professor Vinícius de Jesus Rodrigues Neves, médico de família e comunidade e docente do curso de medicina da UFMS de Três Lagoas, afirma: “Vejo na existência de um hospital universitário um potencial que se transparece em diversos aspectos: fortalecimento do curso, que terá mais cenários de prática, com mais autonomia sobre eles; contribuição na qualificação do corpo clínico do município, esteja ele vinculado ao curso ou não; potencialização da criação de programas de residência médica no município, o que é um importante fator de qualificação e fixação local de profissionais; contribuição com a conexão com a rede, seja no trânsito dos estudantes entre os pontos de atenção à saúde, seja no trânsito de profissionais, seja na complementação de serviços, além de qualificação da referência e da contrarreferência, otimizando o cuidado dos pacientes. Porém, para tanto, é necessário que tenhamos uma gestão hospitalar que pense academicamente, que se estruture para ter estudantes lá dentro e que fomente o ambiente de ensino; não podemos ter pontos de atenção à saúde, sejam eles quais forem, desvinculados das práticas de ensino, da pesquisa e da extensão.”
A questão da administração quanto ao modelo de gestão hospitalar
Em entrevista ao Perfil News, no início do ano, o Secretário estadual de Saúde de Mato Grosso do Sul, Geraldo Resende, informou que seria montado um grupo de trabalho para definir a forma de gestão do HRTL. Ele adiantou que não será via administração direta (pelo governo do estado de Mato Grosso do Sul).
Entre as principais possibilidades quanto à gestão do Hospital, há a administração via parceria público-privada (PPP), via Organização Social de Saúde (OSS) ou também pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).
Parceria público-privada (PPP)
A PPP é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa, que tem por objeto a execução de serviço público. A PPP pode ser um instrumento importante para o Estado, tendo em vista suas necessidades estratégicas, otimizando o uso dos recursos disponíveis.
A adoção de programas de PPP em diversos países é impulsionada pela necessidade de dar continuidade do investimento estatal em um contexto de restrição fiscal e pela busca de maior eficiência na prestação dos serviços públicos. Na mesma entrevista ao Perfil News, o secretário explicou que a decisão de repassar a administração à instituições parceiras é uma necessidade para que se respeite à Lei de Responsabilidade Fiscal, pois o Estado de Mato Grosso do Sul está no limite de contratação de pessoal, não podendo absorver a quantidade de colaboradores que o Hospital demandará.
Organização Social de Saúde (OSS)
A Organização Social é um título que o Poder Executivo outorga para uma entidade privada sem fins lucrativos com atividades dirigidas ao ensino, pesquisa e saúde. Na literatura, foram encontrados estudos comparativos entre o gerenciamento de hospitais via administração direta (AD) e via OSS, em que foram encontradas evidências de ganho de eficiência das OSS frente às unidades de AD, por uma influência positiva da autonomia administrativa e financeira que as OSS possuem.
Exemplo disso é que nas unidades das OSS, o orçamento é visto de maneira global; no da AD, o que importa para o executivo, de fato, são os recursos destinados à compra de suprimentos e à contratação de serviços. Os recursos de folha de pagamentos não estão sob gerência do diretor e, portanto, deixam de estar presentes nas suas preocupações cotidianas. No caso das OSS, faz parte do dia a dia do executivo saber se vai ter dinheiro a cada mês para pagar os salários.
Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH)
A Ebserh é uma empresa pública de direito privado, vinculada ao Ministério da Educação, com a finalidade de prestar serviços gratuitos de assistência médico-hospitalar, ambulatorial e de apoio diagnóstico e terapêutico à comunidade, assim como prestar às instituições públicas federais de ensino ou instituições congêneres, serviços de apoio ao ensino, à pesquisa e à extensão, ao ensino-aprendizagem e à formação de pessoas no campo da saúde pública.
A Ebserh trata-se da maior rede de hospitais públicos do Brasil com uma rede que inclui 43 Hospitais Universitários Federais. A criação da Ebserh integra um conjunto de ações empreendidas pelo Governo Federal no sentido de recuperar os hospitais vinculados às universidades federais. A missão da empresa é aprimorar a gestão dos Hospitais Universitários Federais, prestar atenção à saúde de excelência e fornecer um cenário de prática adequado ao ensino e pesquisa para docentes e discentes.
Matéria de dezembro de 2020, realizada pela equipe do jornal da época.